Valor Econômico Análise: Medidas fiscais não vão substituir a política monetária
O que importa, no fim das contas, é como a política fiscal se transmite para a inflação
Por Alex Ribeiro, Valor — São Paulo
23/05/2025 11h08 Atualizado há 3 horas
As medidas fiscais adotadas ontem pelo governo não vão substituir o trabalho da política monetária do Banco Central para fazer a inflação cair para a meta.
Desde ontem, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o presidente do BC, Gabriel Galípolo, e outros integrantes do governo estão procurando passar a mensagem de que a autoridade monetária não teve participação na decisão de ampliar a taxação sobre crédito e remessas ao exterior.
O que se sabe sobre a decisão: Galípolo, historicamente, manifestou dentro do governo a sua oposição à taxação com Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). E não houve uma consulta sobre o conjunto de medidas anunciado ontem. Sobre o IOF na remessa de capitais, o presidente do Banco Central soube depois.
Os integrantes do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC têm batido na tecla, há muito tempo, de que não existe uma relação mecânica entre a política fiscal e a política monetária.
O que importa, no fim das contas, é como a política fiscal se transmite para a inflação. Isso depende, em boa medida, de como cada medida afeta as expectativas dos agentes econômicos. Ou seja, de como a cotação do dólar e de outros ativos sobe e desce devido às decisões sobre gastos e arrecadação, assim como são afetadas as projeções de inflação. A política fiscal também se transmite pela demanda agregada, o que pode facilitar ou dificultar a queda da inflação.
Há um impacto também significativo na credibilidade da política monetária. O maior risco é o mercado achar que o governo está querendo substituir, com o controle de crédito e da taxa de câmbio, o trabalho que deve ser feito pelo Banco Central com a taxa Selic.
O Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) adotado ontem pelo governo — com um recuo parcial — alimenta esses receios. O aumento das alíquotas sobre o crédito bancário tem o efeito de encarecer os empréstimos e ajudar a esfriar a economia. O IOF sobre remessas é, na essência, um mecanismo de controle de capitais que atua na direção de valorizar a moeda brasileira.
Em tese, isso poderia ajudar a baixar a inflação, mas há um canal mais potente em outra direção: as expectativas de mercado são negativamente afetadas e, com isso, o dólar sobe. O passo seguinte — mais preocupante — seria um aumento das expectativas inflacionárias.
Em dezembro de 2010, houve um desastre nas expectativas quando o Banco Central, já na transição para Alexandre Tombini, adotou um pacote de medidas macroprudenciais que — na leitura do mercado — procurava substituir o trabalho que estava sendo feito na política monetária.
Por isso, a preocupação da equipe econômica e do resto do governo é mostrar que o Banco Central não tem nada a ver com a medida e que, no fim, o Copom vai tomar as suas decisões com base no resultado que elas tiverem no cenário inflacionário.